A definição mundial de Serviço Social da Federação Internacional de Trabalhadores Sociais (FITS) foi o tema de mais um evento promovido pelo CFESS. Nos dias 8 e 9 de março, o Conselho Federal reuniu, no Rio de Janeiro (RJ), representantes de 8 países, além de assistentes sociais e estudantes brasileiros/as, representando os CRESS, a ABEPSS e a ENESSO, no Workshop sobre a definição mundial de Serviço Social da FITS. Realizado com tradução simultânea, o encontro contou com representantes da Argentina, Paraguai, Uruguai, Costa Rica, Porto Rico, Chile, República Dominicana, além do Brasil, totalizando 83 participantes. Além destes, a representação internacional da FITS e da Associação Internacional de Escolas de Trabalho Social (AIETS) veio da Nova Zelândia, Dinamarca e Mauritânia.
“Lutamos para que a FITS represente um mundo do trabalho social onde caibam todos os mundos. Estamos aqui para elaborar uma proposta comum de definição, como fruto do processo histórico que vem sendo construído pelos/as assistentes sociais do Brasil e da América Latina, ao longo das últimas décadas”, afirmou a presidente do CFESS.
Em seguida, o secretário-geral da FITS, Rory Truell, enfatizou a importância de tantas entidades reunidas para discutir uma definição mundial de Serviço Social. “Para nós, é fundamental poder compartilhar esse momento para que possamos proporcionar que assistentes sociais de todo o mundo se identifiquem em uma definição mundial. A colaboração de países diversos, como vemos aqui, já demonstra um grande passo nesse processo. Parabéns ao CFESS por reuni-los”, disse.
Também na mesa de abertura, o ex-presidente da AIETS, Abye Tasse, registrou a importância das lideranças latino-americanas na condução do processo de revisão. “É fundamental e gratificante ver regiões que antes tinham pouca voz, como a América Latina, com tamanha projeção na arena internacional do Serviço Social. Para uma definição de Serviço Social ampla, precisamos acreditar que existe a possibilidade de abordarmos contribuições de todo o mundo, reconhecendo as diversidades locais”, apontou.
Contextualização histórica
O debate continuou com a mesa “Contextualização histórica do processo de definição de Serviço Social da FITS e propostas de definição”. As primeiras palavras foram do representante da FITS para Europa e coordenador da Comissão sobre a definição da Federação Internacional, Nicolai Paulsen. Segundo ele, é preciso identificar uma definição de Serviço Social que seja entendida não só pelos/as profissionais, mas também pelos/as usuários/as e pela sociedade, pois é dessa maneira que contemplará reivindicações diversas.
“Ocorre que, para isso, uma definição global precisa estar mais próxima da generalidade. A iniciativa brasileira em 2010 foi de fomentar o debate e ajudou na aceitação da necessidade de contemplar maior clareza quanto às especificidades regionais, em especial da América Latina, em uma nova definição. No entanto, há que se lembrar ainda dos outros continentes e suas características”, definiu.
O professor Abye Tasse fez um histórico sobre o processo de construção da definição de 2000 e defendeu a aliança de grupos distintos na elaboração de um novo conceito. “Está claro que vivemos um momento de emergência de novas forças no cenário político internacional de Serviço Social. A maneira com que conseguimos ter aqui tantos países unidos nessa proposta é admirável, porém não podemos esquecer que, se mudanças significam movimento, teremos algo a analisar novamente no futuro”, observou.
Com uma saudação especial às mulheres guerreiras do Serviço Social, a professora Marilda Iamamoto (UERJ), explicou que o propósito de sua intervenção era o de explicitar os fundamentos da definição proposta pelo CFESS no marco do momento de revisão crítica do Serviço Social brasileiro. “A América Latina e o Brasil não se sentem representados pela definição mundial da FITS ora presente; propomos um debate global para enfrentarmos à realidade sociopolítica e econômica que se coloca, com a crise do capital. Nossa luta é em defesa da intervenção do Estado na garantia dos direitos, da ascensão dos movimentos sociais, do fortalecimento dos direitos sociais da população. Nesse sentido, se expressa a importância desse evento, uma vez que estamos dialogando com instituições de alcance mundial”, registrou a professora.
América Latina se posiciona
Para falar sobre o “Posicionamento da América Latina sobre a definição de Serviço Social da FITS”, mesa realizada na tarde do dia 8, a palavra foi dada à presidente da FITS para América Latina e Caribe, Laura Acotto. Segundo ela, os conceitos que envolvem a definição mundial precisam levar em conta as realidades de cada país, porém os aspectos analisados têm significados muito diferentes em cada nação, “o que gera a nossa dificuldade de escolher as palavras para estabelecer a proposta que queremos apresentar. Podermos estar aqui reunidos e mostrar à FITS que também podemos produzir e sugerir uma nova definição de Serviço Social é fundamental no processo de fortalecimento político de nossa região”, disse ela.
Para a presidente da Associação Latino-americana de Ensino e Investigação em Trabalho Social (ALAEITS), Lorena Molina (Costa Rica), as competências técnicas e os requisitos do mercado de trabalho na lógica capitalista “não podem se sobrepor ao que defendemos para a formação e para o exercício profissional. É fundamental uma postura crítica, com embasamento sócio-político a favor da emancipação humana”, apontou a presidente, antes de apresentar a definição proposta pela ALAEITS.
Representando o CFESS, a professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Ana Elisabete Mota, afirmou que o debate propiciado pelo workshop foi uma oportunidade ímpar. “Temos a chance de promover a democratização do saber, fruto da luta histórica das entidades regionais e internacionais. Trata-se de um movimento, cuja processualidade aponta para a democratização mundial da definição de um conceito que define o trabalho dos assistentes sociais”, disse a professora. Ela acrescentou que a importância estratégica do evento se dá na possibilidade de que o processo de articulação política das organizações da América latina, em curso, pode vir a se transformar em projeto coletivo para o mundo.
“É preciso contemplar aspectos fundamentais: posturas éticas, fundamentos teóricos, experiências práticas e requisitos técnicos, respeitando as particularidades da realidade e da ação profissional dos países que compõem a nossa região”, declarou a professora.
O Workshop seguiu com a reunião de trabalho para discussão e aprovação de uma proposta comum, com as contribuições dos países, a ser apresentada à FITS, na Assembleia em Estocolmo, em julho de 2012. A finalização da proposta ocorreu na manhã do dia 9 de março, na Capela Ecumênica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Avaliação é positiva
A dinâmica da reunião de trabalho fluiu com as contribuições das organizações nacionais enviadas pela Argentina, Porto Rico e Uruguai, a partir do texto preliminar produzido pelo Brasil. Todos os/as presentes puderam acompanhar o debate entre os/as representantes das organizações nacionais, tendo em mãos os textos em português, espanhol e inglês. O processo de discussão seguiu os itens da atual definição da FITS e, à medida que as intervenções eram feitas, buscava-se a construção de um texto comum que representasse o pensamento coletivo.
Para a conselheira do CFESS Esther Lemos, a aprovação de uma proposta unificada foi uma conquista do Serviço Social brasileiro e latino-americano. “Nosso objetivo não era construir um texto para e da América Latina, mas, a partir da experiência latino-americana, construir uma definição de Serviço Social que expressasse o patrimônio teórico-metodológico e ético-político que herdamos, projetando a profissão para o futuro e para além de nossas fronteiras. A sensação, ao final de nosso trabalho foi de intensa realização, pois o esforço coletivo de objetivação do pensamento acumulado produziu um resultado no qual nos reconhecemos”, disse ela.
Segundo o representante da FITS para Europa e Coordenador da Comissão de Definição, Nicolai Paulsen, o aprendizado que fica é o de que é possível se ter uma definição mundial de Serviço Social que contemple as particularidades das várias regiões do mundo. Ele surpreendeu os participantes na mesa de avaliação do workshop, quando publicamente expressou seu reconhecimento. “Aproveito para convidar o CFESS e a ALAIETS, por meio de Sâmya e Lorena, a serem membros da Comissão mundial que discutirá a definição junto com FITS e a AIETS”. Todos receberam esta decisão com aplausos emocionados.
Em seguida, o professor Abye Tasse parabenizou os/as assistentes sociais brasileiros/as pelo que chamou de “impressionantes dois dias de trabalho”. “Esse mundo do Serviço Social se transformou nos últimos dois dias. É uma lição para outras partes do mundo. Espero que essa energia e postura combativa esteja cada vez mais presente em todos os assistentes sociais, mundo afora. Acredito que teremos uma definição inovadora e inclusiva”, concluiu o professor.
O presidente da ADASU, Rodolfo Martinez, também avaliou o evento. “Queremos chamar a atenção dos/as companheiros/as de fazer o esforço de entender que o que elaboramos aqui é uma contribuição pelo direito que temos de reivindicar, não uma concessão que nos foi dada. Pedimos aos membros da FITS que transmitam aos demais as importantes discussões e o nosso histórico de árduas lutas que aqui foi registrado”, observou.
Para a representante da FAAPSS (Argentina), Silvana Martinez, o destaque foi a oportunidade de o grupo produzir tantas discussões políticas. “O que vivemos nesses dias foi produto de uma luta histórica de perseverança de nossa profissão, de força do Comitê Mercosul que, em meio às adversidades, elaborou uma proposta de definição fruto de um trabalho coletivo. Sinto-me privilegiada por fazer parte dessa história, começamos a compreender a importância de participar das instâncias internacionais; é assim que nos sentiremos parte da FITS”, afirmou.
A representante do Paraguai, Analia Fresco, enfatizou que os dias de trabalho no workshop “nos fortaleceram enquanto assistentes sociais no mundo”. “Que possamos estar presentes à Assembleia de Estocolmo, fazendo corpo nas organizações profissionais internacionais, e que compartilhemos esses debates em nossos países e com nossos colegas, pois é dessa maneira que fortalecemos nossas lutas”, avaliou.
O secretário-geral da FITS, Rory Truell, ficou satisfeito com as “maneiras de dialogar e negociar das organizações latino-americanas”, que, segundo ele, apresentaram propostas que muito tem a oferecer para o Serviço Social de todo o mundo. “Espero que o Serviço Social latino-americano possa servir de modelo como base para o alcance de direitos sociais em todas as regiões”, afirmou. Para surpresa dos presentes, secretário informou que os documentos da Federação Internacional serão traduzidos para a língua portuguesa e que recomendará à Assembleia da FITS que o português seja incluído como língua oficial da entidade. Outro importante compromisso assumido pela FITS foi de que buscará viabilizar financiamento para que todas as organizações latino-americanas possam estar representadas na Assembleia de Estocolmo.
A presidente do CFESS, Sâmya Ramos, definiu o workshop como um rico e produtivo momento de trabalho, que por sua vez traz à categoria ainda mais desafios. “Que possamos fortalecer nossas organizações profissionais da América Latina, para consolidar nossa presença e levarmos esse debate a mais companheiros/as, colocando a nossa voz para o mundo. Estamos fazendo história, a partir das conquistas de muitas gerações que nos antecederam, seguindo nas articulações políticas internacionais na perspectiva de contribuir para uma transformação emancipatória da sociedade em que vivemos”, concluiu.